Arrumando as maquiagens

Começou com uma pergunta inocente (porém duvidosa): 

“Mãe, posso arrumar suas maquiagens?”

Quem quer saber é Stella, minha filha de 9 anos. 

Olha, se você é mulher você sabe o que a sua maquiagem significa pra você. É aquele pequeno tesouro escondido no seu armário do banheiro que é capaz de transformar um dia ruim num dia menos-pior. Carrega em seu cerne o superpoder de fazer você gostar um pouquinho mais de si mesma, de se sentir um tiquinho mais bela. É o seu porto seguro para os dias de TPM, de cabelo ruim, de espinha que brota do nada…

Ah, nossas maquiagens… já nos acompanharam por tanto.

E, sejamos sinceras, você investiu uma pequena fortuna nelas. 

Então quando Stella vem com essa proposta indecente, a minha primeira reação é dizer:

“é claro que não, se você quiser arrumar alguma coisa, que tal o lego da sala?”

Mas ela me olha com um rostinho angelical e eu dobro a língua. Convenhamos, ela tem quase dez anos, já carrega uma dose de responsabilidade. Já sabe fazer ovo mexido e brownie. Já sabe cuidar da irmã. E já tem coordenação motora o suficiente pra brincar com meu frágeis frasquinhos de make. Em alguns anos ela inclusive estará fazendo o uso desse meu pequeno tesouro (socorro, tempo, vai mais devagar)

Lea, de 5, não me convence muito. Mas fazer o quê? Decido dar o benefício da dúvida para as duas. Não é mais como se elas tivessem 2 anos de idade, que gostavam de comer meu batom, se banhar em perfume e pintar as paredes com as minhas sombras. Respondo:

Lanço para a Stella um olhar cúmplice e ela já entendeu. Vai ficar de olho na irmã.

As duas saem correndo em direção ao meu banheiro. Sua alegria me contagia e de repente estou animada! Oras, o que pode dar errado?

Alguns minutos depois elas me aparecem: 

Isso é um rímel (ou máscara de cilios) lindo e chiquérrimo da Lâncome que comprei há uns – juro – sete

anos e devo ter usado duas  vezes na vida… três no máximo. Por que a gente faz isso? Compra as coisas e depois fica economizando até que ela estraga para todo o sempre?

Mas o rímel é só o primeiro item da vasta lista de coisas que elas vão me trazer nos minutos seguintes. Elas trazem paletas de sombras que eu um dia comprei (me vislumbrando como uma estrela de cinema cool e interessante) e, óbvio, nunca usei. 

Elas me trazem também coisas com nomes gringos como primers, bronzers e curvex (“mãe isso é pra quê? Pra fazer cirurgia?”) além de hidratantes faciais, bases e batons vermelhos 24 horas – coisas que eu já usei um dia, muito tempo atrás, no chamado “velho normal”. Elas se animam com a quantidade de itens que estão fora de uso, e logo vem os fatídicos: 

Num misto de nostalgia e desapego, acabo dando de presente para elas alguns itens que já sei que não vou mais usar porque, em algum momento nos últimos dois anos, deixaram de combinar comigo. Estranha a vida né? 

Elas ficam extasiadas com os presentes e, enquanto organizam as minhas maquiagens, montam também um kit para si. Me pergunto se esse era um dos objetivos da coisa toda. Talvez. Prefiro apenas imaginar. 

Mais tarde, depois de um tempo sem receber visita delas na sala, vou até o banheiro para ver se está tudo bem: 

E eu, crente que estou passando um estilo de vida clean e minimalista pra elas… (nota mental: não deixar coisas inúteis* se acumularem. *lembrando queinútil’ é um conceito relativo.)

“Ficou lindo Teté!” exclama a pequena, que ainda fica absolutamente maravilhada com tudo que acontece ao seu redor.

Stella responde, cética: 

Nem minha filha bota fé em mim!

Não sei se me sinto ultrajada ou se rio…

As vezes acha que as coisas passam despercebidas e quando a gente vai ver, tá todo mundo sabendo de tudo. (Sinceramente, eu culpo o signo. Taurinos são universalmente conhecidos pela incapacidade de organização.)

Enfim. Foi um dia animado. Acabamos com uma caixa de maquiagens arrumada, alguns presentes distribuídos, e certas verdades reveladas.

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