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Todas as estrelas no céu

EU: “Olhem só as estrelas, que lindas, crianças!” 

Chamo as crianças para admirarem o céu estrelado comigo. É uma raridade um céu estrelado em São Paulo.

Simon e Stella, do alto de seus 11 e 8 anos, olham para cima sem emoção alguma e reviram os olhos com sua leve arrogância juvenil como se já não aguentassem mais a mãe idosa lhes apontando algo tão banal quanto a natureza.

Mas Lea, de 4 anos, olha para cima maravilhada. Que delícia que é uma crianças de quatro anos!!

Ficamos ali, nós duas, em silêncio alguns minutinhos, apreciando o céu escuro com seus pontinhos luminosos, que são quase impossíveis de enxergar em São Paulo. Foram meses difíceis, marcados por perdas irreparáveis, dores agudas. Momentos de medo e incerteza. Então é gostoso estar junto com quem se ama. É bom se distrair.

Até que ela pergunta, de repente:

FILHA: “Mamãe, né que todo mundo que morre mora no céu?”

Olho para ela. Seus olhos brilham e seu rostinho reluz com a sabedoria e a compreensão ingênua que só as crianças têm. Uma visão de mundo só delas, que inevitável e infelizmente vai sendo desconstruída com o tempo. Ela insiste:

Suspiro fundo e respondo:

EU: “Não sei, filha.” 

Porque eu não sei mesmo. Para onde vão os nossos queridos, nossos amores, as pessoas que nos deixam aqui para ir para outra dimensão?

Eles vão para outra vida? Somem? Evaporam? Confesso que tenho pensado muito nisso nos últimos meses. Desde que essa pandemia começou e que tantas pessoas queridas se foram.

FILHA: “Vão sim, mãe. Eles moram no céu, junto com as estrelas. O nono. A Marisa. O vizinho. A irmã da sua amiga.”

Ela começa a listar com seus pequenos dedinhos as pessoas amadas que perdemos nos últimos seis meses. Pessoas que nos deixaram com muita dor e uma saudade tão grande que nem cabe na gente.

Sinto o coração apertar. 

Acho que ela percebe. Porque pega minha mão e com sua certeza infinita, diz:

FILHA: “E se você ficar com saudades é só olhar para cima, tá?”

Deixo a dica para todos os saudosos como eu.

Não sei se funciona.

Mas é uma ideia.