Lea está andando pela casa muito concentrada. Na sua mão, cotonetes.
Curiosa, pergunto:
EU: Filha, aonde você vai com isso?
Ela diz, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, a mãozinha firme ao redor dos cotonetes, o olhar determinado.
Fico tensa e, num flash, todas as notícias aterrorizantes que já li sobre o mal que cotonetes podem fazer ao ouvido humano passam pela minha mente (não vou discorrer sobre tais atrocidades aqui. Se quiser fique a vontade para jogar no google e se aterrorizar comigo.) Sinto arrepios ao imaginar ela com toda a falta de coordenação que cabe ao seu ser de seis anos desbravando as profundezas de seu singelo ouvido.
Meu primeiro instinto é confiscar os cotonetes, sem nem perguntar. Mas fico com pena. Ela parece tão feliz com eles. Imagino o quão difícil deve ter sido escalar a pia pra alcançá-los.
Decido investigar. Sou a própria Bond, Mommy Bond.
De trás da porta vejo que ela está brincando com os cotonetes na sua casa de bonecas. Em vez de usar os bonequinhos de sempre, ela usa os cotonetes, como se fossem personagens da história.
O cenário é completamente indefeso.
Enxerida que sou, pergunto:
Uma resposta sensata. Os bonecos cansaram de brincar, oras. Justo.
EU: E por que você quis usar os cotonetes?
Minha pergunta aqui: por que não usar qualquer outro brinquedo disponível ali ao seu alcance. Para que se aventurar no banheiro atrás do cotonete, essa coisa tão frágil, tão sem graça.
ELA: Porque eu adoro cotonetes, mamãe.
Ué. Desde quando?
EU: Adora?
ELA: Sim! Dá pra fazer muuuuuitas coisas com cotonetes.
(Ela faz um bico quando diz a palavra muitas, prolongando o som do U.)
EU, enxerida: Tipo o que?
Ela dá um suspiro cansado, como se responder àquelas perguntas enfadonhas estivesse exaurindo sua beleza.
ELA: Dá pra limpar os unicórnios…. (ela passa o cotonete pelo pequeno unicórnio de plástico)
Enumera com seus dedinhos as diversas possibilidades.
Em momento algum a palavra “ouvido” é mencionada.
Me ocorre, então, que ela talvez nem lembra que os cotonetes são usados no ouvido. Veja só.
Ainda processando toda essa informação, roubo um beijo da sua bochechinha macia e decido deixá-la em paz com seus cotonetes.
Quer dizer, personagens.
Volto aos meus afazeres, me perguntando em que momento me tornei essa adulta sem graça que acha que um objeto tão mágico e fantástico como um cotonete serve apenas para limpar os ouvidos…
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Em tempo: encontrei uma cadeira encostada na pia do meu banheiro e todas as minhas maquiagens e cremes abertos. Já sei como ela alcançou os cotonetes.
RIP* maquiagens e cremes.
(rest in peace)